Uma trabalhadora que recebia R$ 300,00 por mês para desempenhar a função de doméstica e cuidadora de uma idosa em residência de Nova Lima teve seu vínculo de emprego reconhecido pela Justiça do Trabalho. A decisão é do juiz Alfredo Massi.
A mulher trabalhou na casa por 7 anos, entre 2015 e 2021. Os réus, uma mãe e um filho, afirmaram terem apenas acolhido uma pessoa que veio do interior para a capital em busca de melhores condições de vida. Ambos afirmaram, ainda, que a mulher era tratada como “irmã do réu”, por morar na casa, ter alimentação, lazer e apenas ajudar nos cuidados com a casa e com a mãe.
Os empregadores foram condenados pela Justiça a realizar o registro na carteira de trabalho da funcionária, além de efetuar o pagamento das parcelas correspondentes ao saldo de salário, aviso-prévio indenizado, 13º salários e férias acrescidas do terço constitucional de todo o período contratual, sendo parte das férias em dobro, conforme previsto na legislação.
CONTINUA APÓS O ANÚNCIO
A decisão estabeleceu o pagamento das multas previstas nos artigos 467 e 477 da CLT, tendo como base de cálculo o salário-mínimo, assegurando, ainda, o direito ao FGTS com a multa de 40% e ao seguro-desemprego à trabalhadora. Foram deferidas, também, diferenças salariais decorrentes do pagamento de somente R$ 300 por mês. A condenação envolveu ainda o direito a uma hora extra diária, durante todo o contrato de trabalho.
“Ao examinar as provas, o magistrado não teve dúvida de que a relação vivenciada entre as partes foi de emprego doméstico. A começar pelo fato de a jovem ter ido morar na casa dos patrões quando tinha 21 anos incompletos, vinda de zona rural do interior de Minas e com baixo grau de instrução. A decisão chamou a atenção para o perfil pessoal da trabalhadora, justamente por corresponder ao diagnosticado em inúmeros estudos relativos à questão do trabalho doméstico no Brasil, nas Américas e no mundo”.
Foi revelado por testemunha que o trabalho da autora era diário, contínuo e sem descanso semanal. A jovem limpava a casa, preparava café, almoço e jantar, além de cuidar da segunda ré, uma pessoa idosa. Poucas vezes ela teria retornado à sua cidade natal.
O juiz rejeitou a tese de que se tratava de uma pessoa “da família” dos réus, argumento que “somente se explica pela lamentável realidade das trabalhadoras domésticas, estruturalmente desvalorizadas e invisibilizadas em seu trabalho de cuidado”.
O magistrado expressou sua lamentação diante da persistência da situação descrita no processo no Brasil. “Subjacente a uma ordem constitucional promissora em termos de direitos e garantias fundamentais, infelizmente ainda vigoram, no país, ecos de um passado colonial e escravista, no qual o trabalhador da economia açucareira, seja no engenho, seja na casa do senhor, não era concebido como ser de direitos, senão como um objeto de extração de trabalho, pura e simplesmente”, destaca ele.
O juiz ordenou o envio de ofícios para o Ministério do Trabalho, o Ministério Público Federal, o Ministério Público do Trabalho, a Caixa Econômica Federal e a Receita Federal. Apesar de apresentação de recuso, os julgadores da Quinta Turma do TRT-MG mantiveram a decisão original. A fase de execução do processo já está em andamento.