Foto: Brenno Carvalho / Agência O Globo

MATÉRIA DO G1

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou com vetos, nesta sexta-feira (8), o projeto de lei aprovado no Congresso que fragiliza regras para o licenciamento ambiental.

Dos quase 400 dispositivos da lei que receberam aval no Legislativo, o presidente vetou 63, segundo informou a secretária-executiva da Casa Civil, Miriam Belchior.

Entre os vetos, 26 são chamados “simples”. Os outros 37 serão aproveitados em uma redação alternativa, encaminhada pelo governo. É o que explicou o secretário especial para assuntos jurídicos da Casa Civil, Marcos Rogério.

Essas alterações serão feitas por meio de um projeto de lei, a ser enviado pelo governo ao Congresso com urgência constitucional — que repõe parte dos vetos, com outra redação, a fim de tratar de vácuos na legislação.

🔎O Congresso Nacional, que aprovou o projeto, decidirá em sessão ainda a ser marcada se mantém ou derruba os pontos vetados por Lula. Mas a equipe de articulação do governo afirmou que trabalha para que eles sejam mantidos.

Segundo Belchior, a decisão sobre barrar os trechos passou por quatro diretrizes:

  • garantir integridade do processo de licenciamento;
  • dar segurança jurídica para empreendimentos e investidores;
  • assegurar direitos dos povos indígenas e quilombolas;
  • incorporar inovações que tornem licenciamento mais ágil sem comprometer a sua qualidade.

🌳MP da Licença Ambiental Especial

Miriam Belchior informou, ainda, que Lula assinará uma medida provisória (MP) que determina a eficácia imediata da Licença Ambiental Especial (LAE) (entenda mais abaixo).

A licença especial autoriza obras e empreendimentos de forma mais rápida, independente do impacto ambiental, desde que a construção seja considerada estratégica pelo governo federal.

A MP entra em vigor ao ser publicada no “Diário Oficial da União” e precisa ser aprovada em até 120 dias pelo Congresso Nacional para que não perca a validade.

O anúncio foi feito em evento no Palácio do Planalto, com a presença da ministra Marina Silva, do Meio Ambiente.

Marina explicou que o objetivo do governo é garantir que não será feito um “licenciamento monofásico”, mas que todas as etapas do procedimento serão devidamente cumpridas.

“É um esforço grande, em termos de fazer com que a gente ganhe, como eu sempre digo, agilidade sem perda de qualidade, e que a gente possa fazer com que esse diálogo constante com o Congresso Nacional possa nos levar a algo em benefício da proteção ambiental, do desenvolvimento sustentável, da proteção dos povos e comunidades tradicionais, e que o Brasil possa inaugurar um novo ciclo de prosperidade, aonde economia não brigue com ecologia, mas façam parte da mesma equação”, disse a ministra.

Propostas do governo

Veja parte do que foi vetado e o que o governo propõe:

  • 🌳Restrição da Licença por Adesão e Compromisso (LAC) apenas para empreendimentos de baixo potencial poluidor:

O que foi feito: Vetada a ampliação para atividades de médio potencial poluidor.

Por quê? Evita que empreendimentos de risco relevante, como barragens de rejeitos, realizem licenciamento simplificado sem análise técnica adequada.

O PL do Executivo, além de restringir a LAC para baixo potencial de impacto, acrescenta limites ao procedimento autodeclaratorio.

  • 🌳Assegura que os entes federativos respeitem padrões nacionais de critérios e procedimentos

O que foi feito: Vetados dispositivos que transferiam de forma ampla a cada ente federado, sem padronização, a responsabilidade por estabelecer critérios e procedimentos de licenciamento — como porte, potencial poluidor, tipologias sujeitas a licenciamento, modalidades especificas de licenças e atividades passíveis de LAC.

  • 🌳Preservação da Mata Atlântica

O que foi feito: Veto para impedir a retirada do regime de proteção especial previsto na Lei da Mata Atlântica em relação à supressão de floresta nativa.

Por quê? A Mata Atlântica é um bioma reconhecido como patrimônio nacional pela Constituição Federal e já se encontra em situação critica, com apenas 24% de sua vegetação nativa remanescente.

  • 🌳Proteção dos direitos de povos indígenas e comunidades quilombolas

O que foi feito: Foram vetados os dispositivos que restringiam a consulta aos órgãos responsáveis pela proteção de povos indigenas e comunidades quilombolas.

Por quê? A limitação proposta no texto do PL aprovado deixaria de fora uma série de povos e territórios em fase de reconhecimento pela Funai e pela Fundação Palmares, contrariando a Constituição Federal.

O novo PL assegura a participação de ambos, prevenindo conflitos e fortalecendo a participação social nas decisões que impactam diretamente modos de vida e territórios tradicionais. Assim, mantém o que está previsto no regramento federal específico.

  • 🌳Veto à dispensa de análise do Cadastro Ambiental Rural (CAR)

O que foi feito: Vetada a proposta que dispensa o licenciamento ambiental para produtores rurais com CAR ainda pendente de análise pelos órgãos ambientais estaduais.

Por quê? A medida protege o meio ambiente, uma vez que somente serão dispensados do licenciamento os proprietários rurais que tiveram o CAR analisado.

  • 🌳Proteção às Unidades de Conservação

O que foi feito: Vetado artigo que retirava o caráter vinculante de manifestação de órgãos gestores de Unidades de Conservação no licenciamento de empreendimentos que afetem diretamente a unidade ou sua zona de amortecimento.

Por quê? A medida reforça a importância da avaliação técnica especializada na proteção de áreas ambientalmente sensíveis, assegurando que os impactos sobre Unidades de Conservação sejam devidamente analisados e considerados nas decisões de licenciamento pelos órgãos gestores responsáveis por essas áreas.

  • 🌳Manutenção da LAE com veto ao processo monofásico

O que foi feito: A criação da LAE (Licenciamento Ambiental Especial) constitui importante instrumento para modernização do processo de licenciamento. Contudo, foi vetado o dispositivo que estabelecia um procedimento monofásico, que autorizaria a expedição de todas as licenças ao mesmo tempo.

Por quê? Porque o processo monofásico exigiria dos empreendedores antecipação de despesas relevantes antes mesmo de comprovada a viabilidade ambiental do empreendimento, que é um dos primeiros passos do processo. Por outro lado, geraria insegurança jurídica passível de judicialização.

Reação a projeto do Congresso

O presidente tomou decisão após uma série de reuniões nos últimos dias com ministros, entre os quais Marina Silva (Meio Ambiente), Rui Costa (Casa Civil), Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais) e Jorge Messias (Advocacia-Geral da União).

A posição tenta se equilibrar entre as pressões do Congresso e de ambientalistas, que cobravam o veto do projeto chamado por eles de “PL da devastação”.

Defensores do texto, como deputados da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), afirmaram que as novas regras desburocratizariam processos para obtenção de licenças ambientais.

Já ambientalistas destacaram que projeto fragilizaria mecanismos de proteção ambiental e colocaria em risco a sustentabilidade de ecossistemas e a saúde da população.

O próprio governo se dividiu durante a avaliação do texto. O Ministério do Meio Ambiente, comandado por Marina Silva, era contrário ao PL, mas pastas como Agricultura e Minas e Energia validavam a medida.

Polêmica

Um dos pontos polêmicos do projeto é a proposta de nacionalizar a Licença Ambiental por Adesão e Compromisso (LAC), uma prática já realizada nos estados.

Nesse modelo, se um novo empreendimento é planejado sem desmatar vegetação nativa, o responsável encaminha pela internet a documentação necessária. Uma autorização é gerada, praticamente de forma automática.

O procedimento vale para atividades de baixo impacto e fica dispensada a análise prévia do órgão ambiental, com o compromisso do empresário de cumprir as normas ambientais.

O Congresso aprovou conceder esse tipo de liberação mediante informações sobre características da área, condições de operação da nova atividade, impacto ambiental e medidas de controle ambiental.

Um estudo do Observatório do Clima, realizado pelos professores Luís Sánchez, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), e Alberto Fonseca, da Escola de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), apontou o risco de uma “proliferação” da autodeclaração nos estados.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

error: O conteúdo está bloqueado. Entre em contato para solicitar o texto.