MATÉRIA DO G1
Apesar de familiar para grande parte dos belo-horizontinos, o Edifício Acaiaca guarda vários segredos em seus 120 metros de altura — e até abaixo deles. No subsolo do icônico prédio localizado no número 867 da Avenida Afonso Pena, no coração da capital, há uma herança que remete a tempos de tensão mundial: um abrigo antibombas.
Como símbolo da arquitetura da década de 1940, o prédio precisou seguir, durante sua construção, normas e determinações da época. A obra começou em 1943, durante a Segunda Guerra Mundial.
“Era um decreto do presidente Getúlio Vargas. Na época, prédios de uma determinada altura eram obrigados a ter um abrigo antiaéreo e o Acaiaca, que aprovou a planta no início dos anos 40, se enquadrava nessa altura e ele foi projetado”, explicou Antônio Rocha Miranda, atual síndico do prédio e autor do livro ‘Edifício Acaiaca: O colosso humano e concreto’.
Oitenta anos depois, a administração do prédio está restaurando o espaço, no intuito de transformá-lo em uma atração histórica e cultural para o Centro de Belo Horizonte.
“Recentemente nós recuperamos esse abrigo, estamos fazendo as obras e vamos abrir para visitação pública”, completou Miranda.
Icônica fachada do Edifício Acaiaca, no Centro de Belo Horizonte — Foto: Frederico D’Ávila/TV Globo
Depósito, cantina, sistema de telefonia
Apesar de a planta ter sido aprovada e a obra iniciada em 1943, o Acaiaca só foi inaugurado em 1947, dois anos depois do fim da guerra. Por causa disso e pelo fato de o Brasil não ter sido atacado durante o período do conflito, o abrigo nunca chegou a ser utilizado.
“Na planta, o abrigo antiaéreo passou a constar como depósito. Como a guerra não aconteceu, era usado por outras pessoas [como depósito], ainda mais que ficava perto de lojas”, relembrou o síndico.
Ao longo dos anos, o espaço também chegou a abrigar uma cantina com refeitório para os funcionários do prédio e uma das salas acabou abrigando todos os fios do sistema de telefonia do prédio.
Depois, se tornou um depósito, que começou a apresentar problemas estruturais. Na necessidade da reforma, a administração viu uma oportunidade.
Abrigo antiaéreo do Edifício Acaiaca em 2023, ainda como um depósito. — Foto: Frederico D’Ávila/TV Globo
Restauração e reabertura
A administração do edifício conseguiu restaurar o projeto arquitetônico original do abrigo, que estava em um papel em péssimo estado de conservação, e entender o funcionamento do abrigo.
“Quando a gente viu que tava tendo esse problema nós começamos a investigar a possibilidade de restaurar [o espaço]. A gente conseguiu detectar que o projeto foi feito à risca: paredes resistentes de concreto maciço, que tem lá, e quatro células e uma saída de emergência”, contou Alexandre Fraga, arquiteto responsável pela reforma.
Originalmente, a saída de emergência era em uma espécie de bueiro em que a pessoa sairia para o estacionamento, quase na parte externa do prédio.
Ali, entretanto, acabaram sendo erguidas, alguns anos depois, as salas que abrigaram o Cine Acaiaca — que seriam desmoronadas em caso de um ataque de bombas, inviabilizando o funcionamento do escape e do próprio abrigo em si.
Projeto arquitetônico restaurado do abrigo antiaéreo. — Foto: Rodrigo Salgado/g1
Anticâmara e sirene
Logo na entrada do abrigo, havia uma sala anticâmara, um espaço de descontaminação em caso de ataque com armas químicas.
“Você entrava nessa anticâmara, passava pelo chuveiro de descontaminação e, depois que tivesse certeza que estava descontaminado ou que não estava contaminado, entrava para as células. Cada célula cabia uma média de 50 pessoas, totalizando 200 que poderiam ficar ali protegidas no abrigo”, completou Alexandre Fraga.
Uma sirene de alerta e os exaustores para troca do ar interno, todos originais, também foram restaurados e estarão em funcionamento para a visitação do público.
Sirene de alarme no abrigo antibombas, em 2023. — Foto: Frederico D’Ávila/TV Globo
“Ainda falta uma grande etapa da obra de climatização e outros processos para que o espaço seja agradável. Não é porque é um abrigo que a pessoa precisa ter todas as sensações da época”, brincou o arquiteto.
O projeto arquitetônico original do abrigo será doado para o Arquivo Público da capital e uma cópia ficará exposta no espaço, contando a história para o futuro público visitante.
O objetivo da administração do prédio é que o espaço fique pronto e esteja disponível ao público até julho deste ano.
Abrigo antiaéreo em 2022 e como ele deve ficar depois da restauração. — Foto 1: TV Globo — Foto 2: Alexandre Fraga/Divulgação