Foto: Lucas Franco/TV Globo

MATÉRIA DO G1

A Polícia Federal detalhou, em inquérito, como a mineradora Empabra forjou a realização de ações de recuperação ambiental de área tombada da Serra do Curral, em Belo Horizonte, para extrair minério de forma ilegal entre os anos de 2014 e 2025.

De acordo com a PF, os responsáveis utilizaram o Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD), aprovado em 2008, como fachada para ampliar a exploração mineral na área da Mina Granja Corumi.

Como consequência, ainda segundo a investigação, a exploração provocou a destruição de nascentes e cursos d’água, como o Córrego Taquaril, além de possível contaminação do lençol freático. (saiba mais abaixo)

Antes e depois de pontos da Serra do Curral, destacados pelo inquérito. — Foto: Reprodução

Antes e depois de pontos da Serra do Curral, destacados pelo inquérito. — Foto: Reprodução

O esquema

Em teoria, o PRAD autorizava a retirada de quatro milhões de toneladas de resíduos de minério historicamente acumulados no local, com prazo de execução de até três anos, sob o pretexto de recuperação ambiental.

Na prática, laudos periciais e auditorias da Controladoria-Geral da União (CGU) e da própria PF apontam que, a partir de 2014, os responsáveis implantaram cavas de mineração de grande porte e continuaram as atividades mesmo após o fim da retirada dos resíduos previstos.

A investigação integra a Operação Parcours, que, no final de março, revelou o esquema envolvendo servidores da Agência Nacional de Mineração (ANM), geólogos e a mineradora Empabra para viabilizar essa exploração na Mina Granja Corumi, e resultou na exoneração de um gerente da ANM.

A PF solicitou à Justiça mandados de busca e apreensão de documentos, bloqueio de bens de ex-gestores ligados à mineradora e realização de diligências complementares para apurar outras possíveis participações de servidores públicos no esquema.

g1 entrou em contato com a mineradora Empabra, com a ANM e com os investigados, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.

Documentos fraudados

A apuração aponta ainda que, entre 2014 e 2019, foram criadas duas grandes cavas na área da mina — chamadas de “Sump 3” e “Sump 4”.

Em documentos oficiais, a empresa informou que se tratavam de reservatórios de contenção de água para recuperação ambiental, quando, na verdade, eram escavações com objetivo de extrair minério in situ — ou seja, minerais ainda presentes no solo.

Servidores públicos também são alvo da apuração por possível omissão ou favorecimento no andamento de processos administrativos vinculados à ANM.

Ainda segundo a investigação, as escavações foram feitas em locais não autorizados, em desacordo com os limites legais da concessão e em áreas vizinhas pertencentes à União.

Antes e depois de pontos da Serra do Curral, destacados pelo inquérito. — Foto: Reprodução

Antes e depois de pontos da Serra do Curral, destacados pelo inquérito. — Foto: Reprodução

Impactos ambientais

Imagens de satélite e documentos obtidos durante a apuração revelam que a exploração provocou a destruição de nascentes e cursos d’água, como o Córrego Taquaril, que secou em 2017, além de possível contaminação do lençol freático.

Os peritos também identificaram que, após a interrupção das atividades em 2019, a área da principal cava passou a permanecer alagada, mesmo em longos períodos de estiagem.

A hipótese levantada é que a escavação tenha atingido o lençol freático, gerando impactos sobre a disponibilidade e a qualidade da água subterrânea na região.

Linha do tempo

  • 1958 a 1990 — Mina Granja Corumi é explorada legalmente pela Empabra para extração de minério de ferro;
  • 1990 — A Serra do Curral é tombada como patrimônio ambiental, histórico e paisagístico por legislação municipal e estadual. A exploração é suspensa.
  • 1994 a 2006 — A mina fica paralisada por força de restrições ambientais. A Empabra é pressionada a reparar os danos ambientais. O Ministério Público move ações civis públicas.
  • 2008 — É aprovado o PRAD (Plano de Recuperação de Área Degradada), com autorização para retirada de até 4 milhões de toneladas de material, reconfiguração do terreno e recuperação ambiental em até 36 meses.
  • 2014 — Retorno da exploração mineral, com criação das cavas profundas, sob o pretexto de recuperação ambiental.
  • 2014 a 2017 — Seca do Córrego Taquaril, destruição de nascentes e relatos de contaminação e falta d’água em empreendimentos da região, como o Minas Country Clube.
  • 2018 a 2019 — Interrupção da exploração nessas cavas profundas, por exaustão de minério ou problemas geotécnicos com o lençol freático. A área passa a ficar alagada mesmo em longos períodos de seca.
  • 2019 — Formalizada a venda da mina por André Maurício aos empresários Kallas, Franceschini e Bruno Luciano. Eles assumem a responsabilidade por danos futuros.
  • 2020 a 2024 — A PF e a CGU intensificam a apuração, com perícias e imagens de satélite que mostram a expansão ilegal e deliberada das cavas, confirmação do uso do PRAD como fachada para lucro com extração de minério e identificação que uma cava atingiu o lençol freático.
  • 2024 — PF realiza monitoramento da área e vigilância fotográfica, comprovando alagamento e bombeamento irregular de água.

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