MATÉRIA DO G1
A Meta informou à Advocacia-Geral da União (AGU) que as mudanças na política de checagem da empresa começarão apenas nos Estados Unidos, e que está comprometida com a transparência, em respeitar os direitos humanos e a liberdade de expressão.
Esses foram alguns dos argumentos apresentados pela empresa em resposta ao governo brasileiro, que notificou a Meta (entenda mais abaixo).
A AGU questionou a empresa — que controla Facebook, Instagram e WhatsApp — sobre como ela garantirá o cumprimento legal da obrigação de combater crimes como racismo e homofobia em suas plataformas, após anunciar o encerramento do seu programa de verificação de fatos.
As mudanças na política da empresa também trouxeram alterações sobre a conduta de ódio.
Dessa forma, a Meta passou a permitir comportamentos que eram proibidos, como publicar xingamentos em posts que discutam direitos de pessoas transgêneros ou associar o público LGBTQIA+ a doenças mentais.
As respostas às perguntas foram enviadas à AGU nesta segunda-feira (13) e o g1 teve acesso ao documento.
Em linhas gerais, a Meta diz na resposta à AGU:
- que a decisão de encerrar o Programa de Verificação de Fatos será aplicada, por enquanto, apenas nos Estados Unidos;
- que a empresa vai testar, também nos EUA, um sistema de “notas da comunidade” para substituir a checagem;
- que a Meta esta “comprometida em respeitar os direitos humanos” e com a “liberdade de expressão, direito humano fundamental que permite o exercício de muitos outros direitos”;
- que a firma “continua a priorizar a segurança e a privacidade dos usuários” e leva a sério seu “papel de eliminar abusos” dos serviços;
- que a Política de Conduta de Ódio, embora tenha sido alterada, “continua a definir as características protegidas, que atualmente incluem raça, etnia, nacionalidade, deficiência, religião, casta, orientação sexual, sexo, identidade de gênero e doença grave”;
- que a Meta continuará removendo do ar conteúdos que incitem violência ou tenham “ameaças plausíveis à segurança pública ou pessoal”;
- que também seguirá removendo publicações com desinformação – quando esses posts gerarem risco de lesão corporal ou possam “interferir diretamente no funcionamento de processos políticos, como eleições e censos”.
- que as mudanças em teste querem “diminuir o exagero na aplicação das políticas” – para que os sistemas automatizados foquem em “violações de alta gravidade como terrorismo, exploração sexual infantil, drogas, fraudes e golpes”;
- que a Meta está “comprometida a informar e a ser transparente com a comunidade sobre quaisquer futuras mudanças relevantes que possam acontecer”.
‘Grave preocupação’
Em nota, a AGU afirmou que “alguns aspectos” do documento apresentado pela Meta causam “grave preocupação” ao governo brasileiro.
“Especialmente a confirmação da alteração e adoção, no Brasil, da Política de Conduta de Ódio que, à toda evidência, pode representar terreno fértil para violação da legislação e de preceitos constitucionais que protegem direitos fundamentais dos cidadãos brasileiros”, mencionou.
A AGU citou ainda que, em manifestação anterior, representantes da empresa asseguraram que as então “políticas de governança de conteúdo” eram suficientes para a proteção dos direitos fundamentais dos usuários — o que difere do posicionamento atual.
“No entendimento da AGU e de ministérios que atuam no tema, os atuais termos de uso das plataformas, assim como as mudanças informadas agora pela Meta, não estão adequadas à legislação brasileira e não são suficientes para proteção dos direitos fundamentais da cidadania”, justificou a AGU.
Diante disso, a AGU sinalizou a realização de uma audiência pública — com participação de órgãos do governo, especialistas, agências de checagem e de entidades da sociedade civil — nesta quinta (16) para discutir os efeitos da nova política implementada pela Meta.
Notificação da Meta
A notificação — extrajudicial — foi a primeira reação oficial ao anúncio de que a Meta encerrou seu programa de checagem de fatos, que minimizava a circulação de fake news, e relativizou discursos preconceituosos e de ódio, principalmente contra imigrantes, população LGBTQIA+ e mulheres.
“Manifestações em plataformas digitais não podem ser realizadas para gerar desinformação sobre políticas públicas nem minar a legitimidade das instituições democráticas, nem causar pânico na população, porquanto tal atuar causa prejuízos concretos ao funcionamento eficiente do Estado Democrático de Direito”, disse trecho da peça.
“Em cenário doméstico, igualmente, a preocupação com o respeito à liberdade de expressão e outros direitos fundamentais – o que pressupõe um ambiente digital livre de desinformação e de discurso de ódio – constitui-se em uma pilastra fundamental antevista pela Constituição Federal”, informou a AGU.
“Nesse sentido, diante das mudanças anunciadas na política da Meta, é imprescindível destacar a necessidade da empresa de promoção e proteção dos direitos fundamentais, com respeito à legislação infraconstitucional e à Constituição de 1988. (…) Importa destacar, sobretudo, quais providências que vêm sendo e que serão adotadas a respeito do dever de cuidado com relação à coibição de violência de gênero, proteção contra crianças e adolescentes, prevenção contra racismo, homofobia e transfobia, prevenção contra suicídio, óbices a discurso de ódio, dentre outros temas de direitos fundamentais”, concluiu.
O advogado-geral da União, Jorge Messias, já havia antecipado ao blog da Daniela Lima que o governo não ficaria “de braços cruzados” diante da guinada promovida pela Meta.
Em outra frente, o ministro Ricardo Lewandowski (Justiça) esteve na sexta-feira (10) com seu contraparte francês. Na pauta: ação conjunta de Brasil e França para o combate à desinformação e ao direcionamento de redes sociais como arma política.
Lula discutiu tema com ministros
A mudança na Meta motivou uma reunião, também na sexta, entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e parte de seus ministros. O governo se preocupa com a falta de veracidade e discurso de ódio nas redes.
Após o encontro, Rui Costa (Casa Civil) disse que a regulamentação das redes sociais está na agenda do governo para este ano de 2025.
Ele lembrou que há uma proposta nesse sentido em tramitação na Câmara dos Deputados. O projeto, no entanto, está parado por falta de consenso entre os parlamentares.
Rui Costa informou que será criado um grupo de trabalho entre ministros para dialogar com parlamentares e entidades da sociedade a fim de tentar aperfeiçoar as leis brasileiras na área.
Conforme o chefe da Casa Civil, o grupo de trabalho discutirá, também, eventuais medidas com impacto econômico nas empresas.
Segundo o ministro, o governo tentará “afunilar” uma posição até a retomada das sessões da Câmara e do Senado. Se houver acordo, o governo aceita aproveitar projetos que já estão em tramitação no Congresso.